Há uma hora
terça-feira, 13 de outubro de 2015
sábado, 22 de março de 2014
Árvore
Julio tem caráter Quixotesco. Emília tem ares de Anna Karennina.
Ambos querem ser Emma Bovary. O narrador diz que o que importa é a
história deles dois, não o resto. Só que Julio continua, Emilia
não. Mas é claro que ele nos engana. Ele diz: “Julio continua”.
Mas o livro tem que acabar, e a história não é tão longa, quiçá
é até banal. Mas o que continua de Julio é o que ele produziu em
sua insanidade causada por uma leitura seletiva de Marcel Proust com
Emilia. Um bonsai que é talvez a não árvore mais quixotesca da
literatura.
Esse é o cenário de Bonsai do chileno Alejandro Zambra que é tido
como uma das vozes mais interessantes da literatura latino-americana
hoje em dia. A prosa dessa novelinha enganosamente despretensiosa vem
provar isso em nível de maestria.
Bonsai é sobre literatura, ou melhor, sobre a literatura escancarada
que retorna a si mesmo como produção dialética que justifica sua
existência. Dito isso, Bonsai é sobre nada. Uma história breve
sobre duas pessoas que leem demais, colidem de menos e enquanto uma
resolve terminar a outra continua.
Bonsai então é uma história de amor. Julio e Emilia se amaram de
verdade se você quiser. Isso também é uma opção. O certo mesmo é
que eles amaram ler Proust & Cia. juntos. O descaso não tão
despreocupado assim com os personagens secundários que fazem
contraste com a linha narrativa principal só faz enfatizar o quão
perigoso é amar. Ou amar ler.
Bonsai, portanto, é a história mais antiga da prosa romanesca de
língua espanhola: Dom Quixote que tem vocação pra ser tanto Emilia
quanto Julio, mas que é forçado a ser Julio, por que, como foi
dito, Emilia se dá ares de Anna Karenina.
Já mencionei que a história inteira nos é dita desde o primeiro
parágrafo? Zambra conta logo de cara que Julio continua, e no final
Emilia morre. Ora, de que vale a história então? Vale por si mesma.
Temos nós mesmo que ser Julio e Emilia lendo sobre Julio e Emilia
que leem sobre Julio e Emilia. Assim como foi a literatura desde
Quixote.
Nesse sentido Zambra é não novo, mas original, por que se quer
consciente dum ciclo que nunca para. Bonsai então é sobre a
consciência tópica da literatura. Mas mais que isso. Bonsai é
sobre a epifania que a arte geralmente tenta produzir da banalidade
fugaz de um momento.
Isso faz a gente pensar em Proust que falou sobre a rememoração
como artificialidade sem deixar de pensar no Cervantes que séculos
antes dissera que essa artificialidade te deixa louco como seu
Quixote. Cervantes que, séculos mais tarde, foi revivido por
Flaubert em Bovary, onde o autor que também não novo, mas original
“inventou” a palavra justa que algumas décadas mais tarde o
jovem Joyce aperfeiçoou, no rastro do seu projeto literário que
utilizava o termo justo “epifanias”, ao ponto da superação da
prosa em níveis astronômicos.
Bonsai então é a imagem dada por Zambra da construção em
epifania de um Julio quixotesco, inconsciente do fim de tudo,
rememorando numa arte abstrata a impossibilidade de trazer uma Emília
(Bovary, ou Karennina quem sabe...) de volta. A árvore, que não é
árvore, mas sim um construto de uma árvore é igual a arte que não
é vida, mas sim uma representação desta.
O trunfo de Zambra é a compreensão de que a literatura pós-Joyce é a literatura da hiperconsciência da própria literatura e sua novela traduz isso de forma original e única por que, em si, Bonsai é, em sua estrutura de novela, curta e catártica (ver vida moderna frenética), uma epifania por encorporar em seu tempo a consciência do que já foi e renová-lo no que já é.
O trunfo de Zambra é a compreensão de que a literatura pós-Joyce é a literatura da hiperconsciência da própria literatura e sua novela traduz isso de forma original e única por que, em si, Bonsai é, em sua estrutura de novela, curta e catártica (ver vida moderna frenética), uma epifania por encorporar em seu tempo a consciência do que já foi e renová-lo no que já é.
Quanto ao tamanho da novela, é
quase como se Zambra rememorasse Poe – que foi um dos primeiros a
pensar a prosa influenciando Baudelaire que o traduziu para o
francês, e assim, por sua vez, influenciando toda gama de autores
que viriam, inclusive os acima citados – que pregava que a história
curta é que produzia o melhor efeito no leitor, pois, a catarse das
histórias lidas em uma sentada é muito mais efetiva do que a
história interrompida na leitura de uma prosa alongada sem
necessidade.
Sem contar que Bonsai é uma bela
história de amor.
sexta-feira, 21 de março de 2014
( )
As
barreiras no romance de Amilcar Bettega são as impostas pelo autor em
forma de complexos quebra-cabeças narrativos que buscam enfatizar a solidão de
seus personagens. O autor gaúcho parece levar a sério (se sério para nós se
confunde com ironia calculada) o nome do projeto que seu romance faz parte.
Amor expresso por si só já é um paradoxo se pensarmos que a expressão já
transforma o amor em outra coisa: palavras.
Palavras.
Palavras ou barreiras.
No
romance, um turco radicado no Brasil finalmente volta ao seu país de origem (d’onde
saiu muito jovem fugido de uma tragédia pessoal e universal – o incêndio de um
mercado, longamente relatado pela obra de um artista enigmático, Ahmet, que
rodeia o romance inteiro – que a barreira da memória o alienou). Ele, tão
gaúcho quanto turco, sai em busca de sua filha desaparecida. Sua narrativa é
pessoal e em primeira pessoa, mas é como se não lhe pertencesse. Aos poucos o
narrador se distancia do personagem como se uma barreira se impusesse para
mostrar o fim desta história. O pai busca em vão por Istambul pela filha sem
perceber que no fundo busca por si mesmo.
Fátima,
a filha, busca o passado (que não é, mas também é) seu por tabela (barreira), no país de origem do pai. Sua narrativa faz parte da segunda parte do romance e complementa a de seu progenitor, porém é como se fossem fantasmas da história inacabada da primeira parte. Apenas possibilidades, barreiras. Bettega constrói uma narrativa
de deja vus, oferecendo, em processo
contínuo, milhões de possibilidades narrativas da última noite de Fátima. Como
Fátima é fotografa, a narrativa parece se confundir com a repetição do processo
de captura do movimento em vários ângulos. O que chamo de deja vus são ensaios sobre as possibilidades de suas últimas horas.
A
terceira e última parte é narrada por Robert, um francês que cruza o caminho de
Fátima por acaso e está com ela na noite em que ela desaparece. Sua narrativa é
construída em forma de espelho com a do pai de Fátima (numa espécie de duelo entre
os dois, desiludidos e perdidos em Istambul).
Robert poderia, numa hipótese ousada, ser o narrador de todas as partes do romance.
Ele não se envergonha de se colocar em terceira ou primeira pessoa quando
necessário. Desse ponto de vista, a narrativa de Robert parece dar a voz ao
autor, como se reivindicasse para si a onisciência falseada pelo truque da
narrativa. O que é bem plausível quando em certo momento do romance um
personagem convenientemente chamado Amilcar interrompe um diálogo (melo) dramático
de Robert com a mãe de seu filho morto pelo telefone, deixando a parábola da
infância do filho sem fim, ao menos para nós.
E
esta técnica continua. Robert deliberadamente esconde coisas de nós sutilmente durante
o resto do romance como se quisesse nos mostrar que na busca frenética dos
personagens para expressar suas identidades, seus passados e suas vidas, as
barreiras existem e existirão em camadas cada vez mais distantes.
Os
encontros e desencontros dos personagens secundários com os diversos
protagonistas de Barreira se encaixam nessa terceira parte e denotam, com certa ironia, seu caráter de
coincidência fortuita, de narratividade farsesca. A barreira então é a metáfora
para a impossibilidade narrativa. Nada é muito dito, muito é sugerido, assim
como nas fotografias e filmes dos artistas perigosos (Ahment, Fátima, Daniel o
filho morto de Robert) que aparecem na história e nas milhões de possibilidades
geradas pela polimorfia narrativa de Bettega. Desta forma, o romance em si se torna, como esforço de
relato, de narrativa e caminho poético, uma imagem de barreira e de
valor ao ser lido. A experiência desta leitura truncada, investigativa e infrutífera é o terreno aberto do romance. A
barreira é a representação da possibilidade.
Nesse
contexto, a arte se traduz na forma que representa o conteúdo de forma
excitante e brilhante. A violência de um mundo que cada vez não se entende, pois relembra o tempo perdido Proust onde os mecanismos impostos (e daí não se inclui só a literatura em si, mas o que ela narra) se intensifica na memória da memória da memória (ou nas fotografias do incêndio, dos suicídios, do passado inatingível). Então, Barreira é, em minha opinião, um dos grandes romances
escritos ultimamente na literatura brasileira. Com cuidado flaubertiano,
Amilcar Bettega escreveu um livro que não tem medo de ser literatura.
terça-feira, 10 de dezembro de 2013
Do Amor
Liguem o Barry White
e abram as garrafas de champanhe que este blog falará sobre o amor. Sim, por
que o amor permeou o cinema de grandes diretores nos últimos dois anos direta
ou indiretamente. O amor inspirou algumas das mais belas histórias que já nos
foram contadas e este blog se disponibilizou a refletir sobre sete desses
filmes, cinco já lançados, dois ainda a serem reproduzidos nas salas de cinema
do mundo.
Este blog se reserva
o direito de comentar dois filmes ainda não vistos pela pessoa que vos fala
pelo simples fato do prazer da narrativa deste texto (e é claro uma escolha
pessoal por que não?). Este blog também se reserva o direito de adotar uma linha
narrativa não muitas vezes coerente com padrões numéricos ou organizacionais,
mas sim conceituais, para que os objetivos deste texto que não são nada mais que a
tentativa sutil de falar sobre o amor, artigo tão raro e tão mal compreendido
quanto superexpostos nas milhões de mídias que temos hoje em dia, sejam atingidos.
Dentre os nomes ilustres
estão Noah Baumbach, Paul Thomas Anderson, Abbas Kiarostami, Terrence Malick, Michael Haneke,
Spike Jonze e Lars Von Trier. Todos eles diretores renomados e assim o são,
devemos lembrar, por histórias que, bem, certamente não figurariam o Ben Stiller
sendo fofinho. *1
Por que então escolher
sete diretores tão diversos entre si que sua única semelhança é ser controverso
e por muitas vezes macabros ou obscuros em suas histórias? O porquê está nos
comentários a seguir.
Frances Ha, de Noah Baumbach (2012).
O filme é uma história de amor, embora ninguém se beije ou faça amor. É a história do amor esquisito, ou amor moderno como a música de David Bowie sugere na narrativa do filme, que a protagonista Frances (Greta Gerwig) nutre para com sua melhor amiga Sophie (Mickey Summer). Sophie é a melhor roommate, a melhor amiga, a melhor tudo. Sophie vai embora e Frances fica perdida em Nova York tendo que crescer a força. Frances só vai superar sua insegurança quando superar seu amor por Sophie e aprender a amar de verdade.
O Mestre (The Master), de Paul Thomas Anderson (2012).
O amor grego é o amor aqui. O bromance mais bonito da história do cinema. O sacerdote Lancaster Dodd (Philip Seymour Hoffman), uma espécie de paródia ao inventor da cientologia, L. Ron Hubbard, encontra pelo caminho a Força Incontrolável da Natureza Freddie Quells (Joaquin Phoenix) e se encanta pelas bebidas caseiras nada ortodoxas que o veterano da marinha perdido no mundo sabe fazer. Numa espécie de narrativa pynchoniana (com trilha radioheadiana de Jonny Greenwood), o diretor P.T.A. nos leva pelos anos de relacionamento entre protetor e protegido sem nunca nos revelar de fato quem é quem. Porém, fica claro que Freddie Quells que nunca consegue se assentar em nenhum lugar é o Aquiles em eterna hubris e Lancaster Dodd é seu fiel Patroclo em eterno sacrifício. O Mestre aqui é aquele que não sente culpa de não se refrear diante do amor que sente. O amor de viver incondicionalmente atropelando tudo. O que Freddie, em atuação brilhante de Phoenix, sempre demonstra é a certeza de seguir em frente em seu destino. O ensinado é o sacerdote que no fim só encontrou deus no amor fraterno e sincero a esta força incontrolável da natureza e não na racionalidade de sua religião. A religação só existe no espiritual. E o amor é o que mais há de espiritual.
Um Alguém Apaixonado (Raiku Samuwan In Rabu), de Abbas Kiarostami (2012).
Em Embriagado do Amor, P.T.A. já desenvolve um pouco o conceito d’A Força Incontrolável da Natureza ao nos transportar para a experiência sensorial de alguém apaixonado com sua trilha esquizofrênica, jogo de luzes cegante, surpresas inesperadas. O diretor iraniano Abbas Kiarostami faz isso a seu próprio estilo nessa fábula que tem um quê de filme de terror. Só que ele o faz através do silêncio que o medo de perder violentamente a quem se ama proporciona pra quem o sente. A jovem prostituta Akiko (Rin Takanashi) se envolve com ternura com um cliente mais velho, o tradutor idoso Takashi (Tadashi Okuno). Após uma noite de sonhos intranquilos (pra usar o clichê mesmo), o carinho estranhamente paterno que ele nutre por ela o faz protege-la de todos os meios que possui de seu namorado violento (uma outra representação d’A Força Incontrolável da Natureza) Noriaki (Ryô Kase). Obviamente, tudo pode dar errado.
Amor (Amour), de Michael Haneke (2012).
A Força Incontrolável da Natureza é o amor que perdura também. Os octogenários Anne e Georges são a construção perfeita do amor. Até que Anne sofre um derrame e lentamente definha para o inevitável. Haneke entre planos claustrofóbicos desenha para nós o apartamento dos últimos dias do amor do casal. Georges está sozinho e o amor solitário não é amor, é sacrifício. A Força Incontrolável da Natureza é perdurar, mas também é libertar. O amor aqui é a vida e a morte. A decisão de Georges é que vai provar seu amor e dar ao título do filme todo o significado. O que é o amor diante da Força Incontrolável da Natureza?
Amor Pleno (To the Wonder), de Terrence Malick (2012)
O que é o amor diante da Força Incontrolável da Natureza? Segundo Malick é o Maravilhamento (o to the wonder, rumo ao maravilhoso do título original). Um casal de estrangeiros (Neil (Ben Affleck) em Paris conhecendo-a, Marina (Olga Kurylenko) vindo morar nos EUA com ele, conhecendo-o) se desencontra no amor. Ele analisa riscos para casas, mas não encontra a casa que quer ter (os planos de casas vazias, a desolação, as paisagens). Ela não tem casa mais, pois se desraigou para ele (sempre pulando). Ele encontra outra, Jane (Rachel McAdams) que não o encontra. O amor é a natureza dele que é errática, uma rima do Freddie Quells de O Mestre. Contra o dia, como sugeriu uma vez André de Leones, também citando Pynchon. Não há casa que não tenha riscos no caminho do Maravilhamento. A casa de Deus tbm é uma Força Incontrolável da Natureza. Malick discutiu Deus em Árvore da Vida. Em Amor Pleno ele o discute através da sua falta. Mas a falta de Deus no padre (Javier Barden) que o procura também é a falta de Deus na procura eterna pelo Maravilhamento que é o Amor Pleno que o título em português sugere. O que é o amor pleno? Por que cavalgamos a força incontrolável da natureza e gastamos nosso amor fraterno, nosso amor moderno e todo o resto em busca dele?
Ela (Her), de Spike Jonze (2013)
Joaquin Phoenix de novo. De bigode. Freddie Quells de novo? Dessa vez um Freddie Quells às avessas. Theodore (Phoenix) é um escritor solitário que encontra conforto e amor em Samantha, a Inteligência Artificial com a voz de Scarlett Johansson que o acompanha pela história. Spike Jonze parece mostrar que aprendeu muito com o Charlie Kauffman sobre roteiros esquisitos, e sobre o amor em situações impossíveis e estranhas. *2 O que Jonze vai nos dizer sobre isso só saberemos no dia 17 de janeiro quando estreia o filme por essas praias, mas pensando na trilha do Arcade Fire, que utiliza músicas de seu último disco que é praticamente todo baseada em Orfeu e Eurídice é que, como na lenda, o amor como Força Incontrolável da Natureza pelo Maravilhamento da música (ou da voz da Eurídice/Samantha) e do enfrentamento do inferno (depressão) pela amada ressoa os outros filmes já mencionados.
Ninfomaníaca (Nymphomaniac), de Lars Von Trier (2013).
Daí é Lars Von Trier. E Lars Von Trier é todinho a Força Incontrolável da Natureza versus o mundo real (leia-se a realidade instituída como real). No caso específico estamos falando do Maravilhamento pelo orgasmo. Na humilde opinião deste blog o orgasmo não é um Maravilhamento tão diferente da música, da voz, da fraternidade ou de Deus. Na verdade, o orgasmo, assim como os outros Maravilhamentos já citados, é o caminho mais certeiro para Deus. Deus sendo o próprio Maravilhamento. O Maravilhamento sendo o êxtase de ser humano, e ser humano como a Força Incontrolável da Natureza de amar. Até a morte. Até a exaustão física, até o sem fim. Joe (Charlotte Gainsbourg) conta a Seligman (Stellan Skarsgård) a história de sua vida sexual (elenco estelar gigantesco) como ninfomaníaca autodiagnosticada que é. Temos que esperar dia 10 de janeiro para saber o inevitável: este filme é amor.
1.
Embora
um deles inclua em um de seus filmes um Adam Sandler sendo impossivelmente Adam
Sandler. (ver Embriagado de Amor)
2.
Embora Brilho
Eterno de uma Mente Sem Lembranças seja do Michel Gondry, este blog se reserva o direito de presumir que
a parceria Jonze/Kauffman (Quero Ser John Malkovich, Adaptação) pode muito bem
ter dados frutos para Ela.
quinta-feira, 28 de novembro de 2013
Amor Moderno
Quando Frances Ha gira,
gira, gira ao som de Modern Love o diretor Noah Baumbach resume o filme.
Obviamente há muito mais a
se dizer, mas cinema muitas vezes é não palavras.
O estatuto de uma obra de arte é algo paradoxal por ser limítrofe e sem limites
ao mesmo tempo.
Ainda bem.
Há tempos escritores
tentam dar conta em palavras (ou coisas semelhantes a palavras) de tudo aquilo
que constitui outras formas de arte.
Exemplo: na cena citada, a
música de David Bowie possui uma letra que é parte narrativa do filme, como no “estranho”
bromance que Frances tem com sua
amiga Sophie. A canção possui um verso que diz que esse “amor moderno” faz a
pessoa, que “nunca irá cair” pelo próprio, chegar “na igreja na hora”, um
paradoxo de como as possibilidades criadas na junção de meios (música, cena, (não) palavras) produzem certo efeito
narrativo que não é narração e é ao mesmo tempo em que é sensação.
Beleza pura poderia se
dizer, pois, no fundo, tudo é técnica. São as palavras não vistas de Greta
Gerwich, a Frances, traduzidas para nós
nos seus rodopios capturados pela lente de Baumbach (dono de algumas das não palavras
do roteiro também), seu tratamento, sua cor, seu movimento. Movimento que emula
as sobreposições artísticas, como num tributo a Nouvelle Vague que nos ensinou
sobre camadas.
A montagem de uma cena de
cinema também é como uma montagem de uma música como a de Bowie. Os acordes
falados pelos instrumentos e as não palavras ditas pela batida ritmada e condizente
da bateria é o que é análogo ao paradoxo de possibilidades que vimos na cena
que resume, em minha opinião, o filme. Se juntarmos paradoxo mais paradoxo temos um
milhão de possibilidades. Possibilidades? Sim esse é o amor moderno sem fim. Em
rodopio eterno.
Frances Ha é, então, sobre
possibilidades. Uma garota de 27 anos em Nova York e as milhões de
possibilidades pra continuar vivendo. Frances sofre de dor de cotovelo e de
indecisão, os ingredientes perfeitos de um “amor moderno”. O Moderno também é
uma definição paradoxal. Ele é e não é. O que é moderno? O que deixou de ser
moderno? Talvez o moderno seja a repetição da odisseia narrativa que baseia a
ideia do homem ocidental moderno.
Frances Ha questiona o que
é ser uma pessoa em tempos modernos, o que é ser moderno, o que é ser. De novo
uma montagem em miríade, em loop, girando, girando, girando. Circular como os
giros e as peripécias de Frances. As possibilidades paradoxais em uma montagem
de não palavras sobre o que é ser
moderno em tempos modernos que não são palavras.
Uma possibilidade? Penso
na história mais antiga de todas: voltar pra casa. Mas o que é voltar pra casa
quando não se sabe o que é sua casa? Na montagem do filme os atos se dão entre
os seus muitos endereços. Frances não tem casa. Ela é um Ulisses revigorado por
seu eterno vício em rodopiar em torno de uma casa que não é sua. O ser moderno
em questão de novo. A questão em loop. Girando.
Girando?
Como o plot:
Frances é bailarina.
Frances ama sua amiga Sophie. Frances não tem uma casa. Frances não tem
palavras. Na odisseia, Ulisses foi ninguém até que ele pode ser o rei de Ítaca
de novo. Como Odisseu, Frances enfrentará desafios e desvios (o casamento de
Sophie, Paris de supetão, o retorno de saturno). Nessa possibilidade que escolhi para as minhas
não palavras sobre o filme, essa história é sobre a viagem
de Frances pra sua casa. No fim, Frances só pode ser Ha assim que encontrar sua
casa. São os rodopios de Frances. É seu “amor moderno”.
Alguns textos bacanas sobre o filme:
André de Leones escreveu: http://vicentemiguel.wordpress.com/2013/09/10/amor-moderno/
Thiago Dantas escreveu: http://www.outrapagina.com/blog/3x4-frances-ha/
Dimas Tadeu escreveu: http://www.papodecinema.com.br/artigos/geracao-frances-ha
terça-feira, 19 de novembro de 2013
Bom é Ser Feliz com Tineijão!
Olá, hoje preparei um resumo especial da melhor banda
linda, o Teenage Fanclub, por que vcs sabem que bom é ser feliz com Tineijão:
Três cantores.
Curiosamente três tenores.
Só o Norman é
barrigudo, que nem o Pavarotti , que é o mais conhecido dos tenores, assim como
o Norman que é o mais conhecido dos Tineiji.
Não é o músico americano
Geral do Amor
Respeite os meus cabelos brancos
Teenage Fanclub: Glasgow, 1989.
Norman Blake (guitarra, voz,
cabelos ruivos do mal);
Gerard Love (baixo, vocais, cientista de foguete);
Raymond McGinley (guitarra solo, voz, existencialismo fofinho).
Os Bateristas:
Brendan O’Hare (ex-batera, poser, brinquinho
do mal, tem lebre no nome):
Brendan O' Lebre
Paul Quinn (desconhecido):
Desconhecido
Frances McDonald (batera, habilidade de ter tocado em todas as bandas da Escócia, herdeiro do McDonald’s)
Doh.
Outros integrantes:
Um tecladista de turnê que eu não sei o
nome e que provavelmente não tem um nome anyway porque tecladistas são maricas.

David McGowan na verdade...
Fun facts:
Kurt Cobain disse que era a melhor banda do
mundo, item 8: http://www.clashmusic.com/feature/teenage-fanclub-bandwagonesque
Queria seu cabelo Norman...
Liam Gallagher disse que era a (segunda) melhor banda do mundo;
E tenho dito...
Discos:
Educação Católica. (1989)

O Rei. (1991)

Bandavagonesca. (1991)

Treze. (1993)

Grande Prêmio. (1995)

Canções da Britânia do Norte. (1997)

Qualé. (2000)

Palavras de Sabedoria e
Esperança. (2002)

Homem Fez. (2005)

Sombras (2010)

Peculiaridades:
Bandwagonesque/Thirteen(1991/1993):
Norman ruivo grunge cabeludo
Grand Prix(1995): Norman ruivo cabeludo do mal

SFNB(1997): Norman ruivo cabeludo tiozinho
Howdy!(2000) em diante: Norman ruivo tiozinho barrigudo.

(escoceses envelhecem rápido)
Se bem que o Gerrard sempre foi meio tiozão de olho azul.
Se
bem que o Raymond sempre foi meio tiozão (vide all my life I’ve been so
uptight)
O Raymond que é um late bloomer (seu disco é o Howdy!) é sem
dúvida o mais tiozão.
(Aliás, ouvir o Raymond cantar I know where I belong na
canção Can't find my way home é paradoxalmente belo)
(de novo: escoceses envelhecem depressa. deve ser o
uísque)
Norman: canções em sol maior; uh neném, neném, eu sou
cabeludão, neném.
The Concept: http://www.youtube.com/watch?v=QhXl-Glv1dg
Mellow Doubt: http://www.youtube.com/watch?v=fc5eDEYAbRQ
Gerard: canções em fá sustenido menor; neném, vamos voar, voar,
subir, subir, bem alto no espaço entre as estrelas na velocidade da luz.
Star Sign: http://www.youtube.com/watch?v=xw49UgKoZnQ
Sparky's Dream: http://www.youtube.com/watch?v=UK_CuMJJLwg
Speed of Light: http://www.youtube.com/watch?v=tNEmcgVAzEs
Raymond: canções em lá maior, sol maior e dó maior; o que eu sou, eu sou; o que eu
fiz, eu fiz.
About You: http://www.youtube.com/watch?v=R_o4jasxsU8
Your Love is the Place Where I Come From: http://www.youtube.com/watch?v=5Qhd6sTMVto
My Uptight Life: http://www.youtube.com/watch?v=op8ijCUIIqA
Resumo:
Teenage
Fanclub é o pagode escocês mais lindo do mundo. OUÇÃO!
quarta-feira, 13 de novembro de 2013
Conta-Gotas.
Assoviou uma canção sobre
não estar apaixonada. Sentiu-se melhor com o ar frio que subia a Rua Augusta.
Quis um cigarro, mas lembrou-se que não sabia se fumava ou não. Não tinha
nenhum na bolsa. A chuva apertou por meio minuto, mas abrandou de novo assim
que ela sentiu uma mecha de seu cabelo grudar no lado esquerdo de seu rosto.
Ainda era feriado para algumas pessoas.
Juliana tinha vinte e cinco anos e era formada em cinema pela Escola de Comunicação e Artes da Universidade de São Paulo. Tinha dois gatos (pelo menos até vinte minutos atrás) um chamado Bóris e outro Vladmir. Nada de Vlad, Vladmir mesmo, sem apelidos. Secretamente tinha medo de fantasmas.
Juliana tinha vinte e cinco anos e era formada em cinema pela Escola de Comunicação e Artes da Universidade de São Paulo. Tinha dois gatos (pelo menos até vinte minutos atrás) um chamado Bóris e outro Vladmir. Nada de Vlad, Vladmir mesmo, sem apelidos. Secretamente tinha medo de fantasmas.
Naquela tarde ela viu dois
filmes: um francês muito ruim e o novo do Woody Allen. Já havia esquecido o
título dois dois logo que a sessão do segundo acabou. Depois de duas cervejas no BH
resolveu voltar para a casa. Ainda chovia sem chover de verdade.
Rafael tinha pedido pizza e passado o dia assistindo às versões estendidas da trilogia do Senhor dos Aneis. Quando fechou a porta atrás de si, Juliana viu o namorado sair do banheiro apressado. Fingiu não perceber que ele se masturbava e deu um oi mastigado por uma calma fingida, mesmo que sincera. Ele comentou que tinha pizza de calabresa. Ela aquiesceu se perguntando por que realmente não tinha ido embora. Contou a ele a trama do filme do Woody Allen que Rafael ouviu com uma desatenção previsível. Tirou a roupa e deixou que ele imaginasse que ela sentia falta dele mesmo.
Rafael tinha pedido pizza e passado o dia assistindo às versões estendidas da trilogia do Senhor dos Aneis. Quando fechou a porta atrás de si, Juliana viu o namorado sair do banheiro apressado. Fingiu não perceber que ele se masturbava e deu um oi mastigado por uma calma fingida, mesmo que sincera. Ele comentou que tinha pizza de calabresa. Ela aquiesceu se perguntando por que realmente não tinha ido embora. Contou a ele a trama do filme do Woody Allen que Rafael ouviu com uma desatenção previsível. Tirou a roupa e deixou que ele imaginasse que ela sentia falta dele mesmo.
Nua na sala comeu um
pedaço de pizza de calabresa sem se importar com o vizinho do apartamento da
frente que fingia não espiar pela cortina. Rafael ainda escorria de dentro
dela e roncava no quarto ao som da trilha étnica do filme que ainda tocava no DVD. Juliana tinha cinco tatuagens: Um kanji que fez quando tinha 16 anos
que podia significar qualquer coisa e que ela sabia que tinha que cobrir. Uma
âncora no braço esquerdo logo acima de uma citação de Hamlet (the rest is silence)
circulando logo acima de seu cotovelo. No braço direito a Morte de Neil Gaiman
e no seio esquerdo as palavras da canção que cantarolava entre mastigadas: We are not in love...
Os gatos dormiam sem saber
de nada. Juliana comia em trancos, assim como falava com as pessoas. Rafael dormia sem saber de
nada, do mesmo jeito. Ela tinha o disco do Crystal Castles que combinava com a chuva, mas não
ia colocar agora.
A chuva ainda brilhava no seu corpo raspando o suor que ainda restava encalacrado nos seus poros. Não
deveria lavar o cabelo, mas mesmo assim o fez. Pensou no filme em que estava
trabalhando como estagiária. Ela não acreditava naquilo tudo. Pensou em seus
roteiros guardados em algum lugar na casa dos pais. Também não acreditava
naquilo tudo. Juliana tentava imitar Robert Smith no chuveiro. A voz saía fanha
demais, pois nunca tinha conseguido enrouquecer a voz aguda e vacilante, mesmo
depois dos dois anos de fumante obsessiva. Talvez não devesse ter largado. Um
cigarro agora seria perfeito. Um cigarro e uma cagada. Rafael ficaria puto se a
visse empesteando o banheiro. Nerd filha da puta.
As gotas caíam dos seus
olhos como as da chuva indecisa que ainda punia São Paulo por ser São Paulo. Juliana
não sabia disso, pois não conseguia ouvir a rua por causa da água do chuveiro
que ainda caia mesmo que ela não se decidisse em levantar da privada para se
limpar e terminar o banho. Já tinha encharcado todo o chão do banheiro e ele fedia a
ela mesma ressentida e ressabiada por tudo que queria exatamente naquele
momento. Juliana se sentia molhada, mais molhada do que nunca. Como conseguia discernir
isso no meio de toda aquela água era o que a fazia cantar a canção mais uma
vez. Retornou ao banho e se masturbou, pois não acordaria o namorado para trepar mais
uma vez. As gotas caíam de sua vagina como se fossem fantasmas da água
encanada, aquecida em resistência inútil. Ela usou só um dedo, o indicador.
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